Dr. Nuno Goulão
médico psiquiatra
psicoterapeuta cognitivo-comportamental integrativo
Burden de Cuidadores
As demências, de Alzheimer e outras, cursam com deterioração cognitiva, dependência gradual e irreversível nas atividades de vida diárias, bem como com alterações comportamentais (deambulação, oposicionismo, desconfiança, desinibição, agressividade, controle obsessivo do familiar, ciúme) e psicológicas (depressão, ansiedade, alucinações e delírios), que podem desencadear constrangimento e sofrimento psicológico nos familiares e cuidadores.
Frequentemente, pelo burden / sobrecarga emocional, os familiares conhecem a desesperança, o isolamento e a disfunção psicológica. A psicopatologia dos pacientes pode comprometer a saúde mental dos familiares. Mais de 50 % dos familiares adoecem psicologicamente, com depressão ou ansiedade patológica.
A inversão dos papéis familiares “agora sou eu que cuido da mãe”, a desestruturação da personalidade do paciente “ele não parece ser a mesma pessoa”, o não reconhecimento da disponibilidade “ele não percebe o meu investimento”, a dificuldade em distinguir temperamento da doença “parece que faz de propósito”, a memória de antigos conflitos “agora, ao cuidar dela, lembro-me de assuntos pendentes”, são alguns dos aspetos que os cuidadores devem identificar e descodificar. A compreensão desta relação pode prevenir sofrimento futuro.
Estes temas são abordados com o psiquiatra que, em intervenções individuais ou de pequenos grupos, faz intervenção psicoeducativa (cedem interactivamente informação sobre demências, abordando dificuldades e resoluções de problemas associados à doença) e apoio psicológico (espaço de partilha de emoções, com normalização de vivências e desenvolvimento de competências e estratégias de coping mais adaptativas).
Os conteúdos abordados com os cuidadores podem ser dversos: expectativas em relação à doença, aos tratamentos em curso, principais receios e dificuldades enquanto cuidador(a), para além de se apurar sobre os apoios de que já dispõe, o que conhece presentemente sobre a doença, e quais as suas maiores necessidades, descrição das demências e da sintomatologia, com especial relevo para os aspetos específicos da demência em questão, aprofundamento sobre a mudança constante das necessidades da pessoa com demência em várias áreas – memória, comunicação, desorientação, a gestão prática de cuidados diários e aquisição de estratégias de coping em diferentes domínios (alimentação, vestuário, higiene pessoal, relações interpessoais, segurança, lazer, alterações comportamentais, agitação, ansiedade, medos, apatia, alterações bruscas de humor, comportamento embaraçoso, agnosia, atividade produtiva delirante e alucinatória, comportamento sexualmente inapropriado, insónia e deambulação, dificuldades ao nível do controlo dos esfíncteres, movimentos involuntários, entre outros), o cuidar de si próprio enquanto cuidador, Fazer face à expectativa da deterioração e morte; trabalho de luto antecipado, informação sobre a principal legislação aplicável (preservação dos direitos da pessoa com demência, suprimento da vontade do adulto incapaz, poder de decisão sobre a assistência em cuidados de saúde, benefícios fiscais, proteção social) e recursos comunitários.
Em muitas situações, com maior gravidade, o psiquiatra pode intervir junto dos cuidadores, para além deste trabalho psicoeducativo, com prescrição de psicofármacos ou de psicoterapia.